segunda-feira, 5 de agosto de 2019

A culpa nem sempre é do carboidrato


Comer proteína e gordura também afeta a glicemia. Pronto, falei!!
Tá achando que é pegadinha? Afinal, durante anos você ouviu dizer que são os carboidratos que fazem subir as taxas de açúcar no sangue. Aposto que no diagnóstico você reduziu ou mesmo tentou parar de consumir batata, pão, torta, macarrão – sem contar os doces, é claro. Mas na hora daquele churrasco na casa do seu cunhado, dá para relaxar. É só não comer pão nem farofa que está tudo bem, a glicemia fica sob controle.
Só que não... Quer dizer, a história não é bem assim.
O assunto é tão relevante e atual que virou tema de uma Nota Técnica do Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira de Diabetes, lançada no último mês de junho. Vale ressaltar que o documento da SBD é dirigido para pessoas com diabetes tipo 1 que seguem a chamada contagem de carboidratos, ou seja, que calculam a dose de insulina que vão aplicar com base na quantidade de carboidrato ingerida a cada refeição.  Mas não se engane: o documento é também de crucial importância para quem tem diabetes tipo 2, especialmente por trazer a público informações embasadas e esclarecedoras.
O que informa a nota? Diversos estudos comprovam que gordura e proteína também podem interferir no perfil glicêmico pós-prandial, ou seja, nos níveis de açúcar do sangue depois das refeições. Lembrando que essa hiperglicemia pós-prandial está fortemente relacionada ao aumento da hemoglobina glicada e, portanto, do risco de complicações futuras.
Como acontece?
Com relação à proteína, em geral o consumo traz um efeito tardio sobre a glicemia (mais de 100 minutos depois da comer). Mas a resposta vai ser distinta dependendo se, na refeição, estiver ou não acompanhada de carboidrato. Estudo citado na Nota Técnica do Departamento de Nutrição da SBD mostra que, em uma refeição sem carboidrato, o aumento da glicemia acontece se forem consumidos mais do que 75 gramas de proteína (aproximadamente 300 gramas de carne). Já em uma refeição com carboidrato, 30 gramas de proteína (cerca de 150 g de carne) já são suficientes para que a glicemia suba mais do que apenas a elevação relacionada ao carboidrato.
Já a gordura, normalmente consumida junto com outros nutrientes, tem a capacidade de alterar a resposta glicêmica do carboidrato. Na verdade, torna mais lento o esvaziamento gástrico e, consequentemente, a absorção da glicose. Mas isso não é bom? Nesse caso, não. A gordura minimiza o efeito da glicemia no pós-prandial (2 horas depois da refeição), mas provoca hiperglicemia ao longo das horas seguintes. Essa hiperglicemia tardia pode perdurar por horas. Imagine que na sexta-feira à noite você comeu pizza. Conferiu a glicemia duas horas depois e estava tudo certo. Foi dormir sem preocupação. Na manhã seguinte, porém, vem a surpresa da hiperglicemia. A gordura da pizza faz com que o carboidrato demore mais para chegar ao sangue. E, quando chega, vem com tudo.
Parece complicado, não é? Ainda mais porque a resposta glicêmica ao consumo de gordura e/ou proteína é INDIVIDUAL.
Mas a solução não é começar a fazer contas, muito menos parar de comer. O que deve servir de lição nessas conclusões da ciência é que não há uma “receita de bolo” muito menos uma fórmula mágica para deixar a glicemia sob controle.  Faça você uso de insulina ou de medicação oral, a saída está no equilíbrio. Embora as dietas low carb (assunto para outro post) possam ter algum efeito no controle da glicemia, não é simplesmente cortando carboidrato do seu plano alimentar que tudo está resolvido. Equilíbrio, repito, é fundamental.
Uma das recomendações do documento da SBD é que, diante de uma refeição com mais gordura e/ou proteína, deve-se intensificar a monitorização da glicemia, especialmente pós-prandial (2, 3 e 5 horas depois da refeição). Sabendo o que acontece particularmente com o seu organismo diante de refeições com esse perfil, fica mais fácil estabelecer uma estratégia para tais situações. Converse com o médico e o nutricionista para saber qual conduta pode ser adotada.
Como bem lembra também a Nota Técnica, a educação é sempre a ferramenta para otimizar a aderência à terapia nutricional, tornando possível à pessoa com diabetes compreender a importância e a influência dos diferentes tipos de alimentos na chamada “homeostase glicêmica” (níveis de açúcar dentro dos padrões adequados) e, consequentemente, na prevenção de complicações de curto e longo prazo.  


Para saber mais:

Sociedade Brasileira de Diabetes: www.diabetes.org.br

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