Tá achando que é pegadinha? Afinal, durante anos você ouviu
dizer que são os carboidratos que fazem subir as taxas de açúcar no sangue.
Aposto que no diagnóstico você reduziu ou mesmo tentou parar de consumir
batata, pão, torta, macarrão – sem contar os doces, é claro. Mas na hora daquele
churrasco na casa do seu cunhado, dá para relaxar. É só não comer pão nem
farofa que está tudo bem, a glicemia fica sob controle.
Só que não... Quer dizer, a história não é bem assim.
O assunto é tão relevante e atual que virou tema de uma Nota
Técnica do Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira de Diabetes,
lançada no último mês de junho. Vale ressaltar que o documento da SBD é
dirigido para pessoas com diabetes tipo 1 que seguem a chamada contagem de
carboidratos, ou seja, que calculam a dose de insulina que vão aplicar com base
na quantidade de carboidrato ingerida a cada refeição. Mas não se engane: o documento é também de crucial importância para quem tem
diabetes tipo 2, especialmente por trazer a público informações embasadas e esclarecedoras.
O que informa a nota? Diversos estudos comprovam que gordura
e proteína também podem interferir no perfil glicêmico pós-prandial, ou seja,
nos níveis de açúcar do sangue depois das refeições. Lembrando que essa
hiperglicemia pós-prandial está fortemente relacionada ao aumento da
hemoglobina glicada e, portanto, do risco de complicações futuras.
Como acontece?
Com relação à proteína, em geral o consumo traz um efeito
tardio sobre a glicemia (mais de 100 minutos depois da comer). Mas a resposta
vai ser distinta dependendo se, na refeição, estiver ou não acompanhada de
carboidrato. Estudo citado na Nota Técnica do Departamento de Nutrição da SBD
mostra que, em uma refeição sem
carboidrato, o aumento da glicemia acontece se forem consumidos mais do que 75
gramas de proteína (aproximadamente 300 gramas de carne). Já em uma refeição com carboidrato, 30 gramas de proteína
(cerca de 150 g de carne) já são suficientes para que a glicemia suba mais do
que apenas a elevação relacionada ao carboidrato.
Já a gordura, normalmente consumida junto com outros
nutrientes, tem a capacidade de alterar a resposta glicêmica do carboidrato. Na
verdade, torna mais lento o esvaziamento gástrico e, consequentemente, a
absorção da glicose. Mas isso não é bom? Nesse caso, não. A gordura minimiza o
efeito da glicemia no pós-prandial (2 horas depois da refeição), mas provoca
hiperglicemia ao longo das horas seguintes. Essa hiperglicemia tardia pode
perdurar por horas. Imagine que na sexta-feira à noite você comeu pizza. Conferiu
a glicemia duas horas depois e estava tudo certo. Foi dormir sem preocupação. Na
manhã seguinte, porém, vem a surpresa da hiperglicemia. A gordura da pizza faz
com que o carboidrato demore mais para chegar ao sangue. E, quando chega, vem
com tudo.
Parece complicado, não é? Ainda mais porque a resposta
glicêmica ao consumo de gordura e/ou proteína é INDIVIDUAL.
Mas a solução não é começar a fazer contas, muito menos
parar de comer. O que deve servir de lição nessas conclusões da ciência é que
não há uma “receita de bolo” muito menos uma fórmula mágica para deixar a glicemia
sob controle. Faça você uso de insulina
ou de medicação oral, a saída está no equilíbrio.
Embora as dietas low carb (assunto
para outro post) possam ter algum efeito no controle da glicemia, não é
simplesmente cortando carboidrato do seu plano alimentar que tudo está
resolvido. Equilíbrio, repito, é fundamental.
Uma das recomendações do documento da SBD é que, diante de
uma refeição com mais gordura e/ou proteína, deve-se intensificar a
monitorização da glicemia, especialmente pós-prandial (2, 3 e 5 horas depois da
refeição). Sabendo o que acontece particularmente com o seu organismo diante de
refeições com esse perfil, fica mais fácil estabelecer uma estratégia para tais
situações. Converse com o médico e o nutricionista para saber qual conduta pode
ser adotada.
Como bem lembra também a Nota Técnica, a educação é sempre a
ferramenta para otimizar a aderência à terapia nutricional, tornando possível à
pessoa com diabetes compreender a importância e a influência dos diferentes
tipos de alimentos na chamada “homeostase glicêmica” (níveis de açúcar dentro
dos padrões adequados) e, consequentemente, na prevenção de complicações de
curto e longo prazo.
Para saber mais:
Sociedade Brasileira de Diabetes: www.diabetes.org.br
Para saber mais:
Sociedade Brasileira de Diabetes: www.diabetes.org.br